terça-feira, 25 de outubro de 2011

Os neurotransmissores e a paixão



Muito boa tarde, leitores! Hoje discutirei um tema que desperta grande interesse para a maioria de nós: a paixão. Não é difícil entender a razão pela qual o tema chama a atenção. Todos nós nos apaixonamos e poucos entendem porque isso acontece e, muito menos, o que regula esse momento cujas características fisiológicas evocam tamanha quantidade de sensações.
Comecemos com uma breve introdução: ao longo da evolução, fomos selecionados para ter sucesso em uma tarefa: passar adiante nossos genes. Isso levou a uma série de artefatos adaptativos que facilitassem que essa tarefa se efetivasse. Isso coaduna com nosso blog pelo fato de que alguns desses artefatos são mecanismos bioquímicos que desencadeiam respostas fisiológicas capazes de nos preparar para a transmissão dos nossos genes. Em outras palavras, somos evolutivamente preparados para o sexo. Ao ver um interessante exemplar do sexo oposto, nosso organismo manifesta um interesse primitivo que é reflexo da ação de neurotransmissores, hormônios e demais moduladores. Essas substâncias são acionadas por meio de estímulos: visuais, táteis, olfativos, fantasiosos. Ilustrando: você anda calmamente, quando percebe que a qualquer momento pode encontrar aquela pessoa que há um tempo já anda bagunçando seu equilíbrio homeostático. Mesmo sem ver, ouvir ou perceber a presença da tal pessoa, seu corpo reage preparando-o para o encontro: irriga com maior intensidade os lábios e genitais, provoca a midríase (aumento do tamanho da pupila), há uma aceleração dos batimentos cardíacos seguido do tradicional frio na barriga (ambos desencadeados pela liberação de adrenalina na corrente sanguínea) e por aí vai.
Há quem divida a paixão em três fases, que se relacionam com os neurotransmissores e hormônios que exercem efeito prevalente no organismo.
  • 1ª fase: Luxúria) Caracterizada, basicamente, pelo aumento de testosterona, provoca o desejo imediato por sexo, com grande aumento da libido.
  • 2ª fase: Atração) É o amor dos primeiros meses, marcado pela euforia e pelo romance. A certa inconstância dessa fase desencadeia a produção quase que contínua de dopamina e noradrenalina, que resultam em exaltação e nas tradicionais perdas de sono e apetite. Baixas concentrações de serotonina garantem que essa não exerça com eficácia sua ação inibitória sobre fatores liberadores de gonadotrofinas (que estimulam a produção de hormônios sexuais) no hipotálamo, ou seja, a concentração dos hormônios sexuais permanece alta.
  • 3ª fase: Ligação) É o amor estável, duradouro e seguro. Principalmente a ocitocina e vasopressina (ADH) atuam, respectivamente, no aumento do desejo sexual, do bem-estar geral e na regulação cardiovascular, com efeitos no controle da pressão sanguínea.

Passada a introdução, vamos tratar um pouco mais a respeito da bioquímica por trás do sujeito apaixonado. Um dos principais neurotransmissores relacionados à paixão é a feniletilamina (ao lado). Essa substância é velha conhecida dos cientistas, mas sua relação com nosso tema só foi descoberta mais recentemente. Há quem diga que no cérebro de uma pessoa apaixonada, podemos constatar concentrações aumentadas de feniletilamina, o que responderia por algumas alterações fisiológicas. Além disso, outras substâncias encontradas com frequência no organismo, como a dopamina e a ocitocina são encontradas juntas com a feniletilamina apenas nos estágios iniciais do flerte. É interessante comentar que o organismo cria uma certa resistência aos efeitos causados por essas substâncias, o que explica o arrefecimento da relação a longo prazo. Vale comentar também que a ação da feniletilamina é bastante semelhante ao das anfetaminas, que influenciam os mecanismos de ação da dopamina e da noradrenalina. As anfetaminas, por sua vez, têm efeito potencializador sobre o Sistema Nervoso.
Outra explicação bioquímica para o efeito da paixão sobre o humor e o bem-estar está na alta concentração de serotonina (abaixo, à esquerda). Essa concentração alterada é possível graças a um mecanismo que estimula sua liberação pelo neurônio pré-sináptico e dificulta sua recaptação. Esse estímulo vem da alta produção de acetilcolina (pela já conhecida via metabólica: acetilcoenzima A reagindo com colina numa reação catalisada pela enzima colina acetiltransferase, que produz acetilcolina e coenzima A). Graças à alta nas concentrações de feniletilamina, também é possível que as taxas de dopamina (à direita) se elevem acima dos níveis normais. O mecanismo de produção da dopamina também é conhecido: a L-fenilalanina é convertida, sob o estímulo de anfetaminas, em L-dopa. Essa reação é catalisada por duas enzimas: dihidrobiopterina e tetrabiopterina. A L-dopa, por sua vez, é convertida a dopamina numa reação catalisada pela dopa-descarboxilase.
Bom, por hoje ficamos por aqui na nossa missão de desmistificar o cotidiano. Tomara que esse post esclareça que por trás do comportamento apaixonado, há alguma explicação bioquímica que perpassa o mundo dos neurotransmissores. E, claro, apesar de todas as considerações desse post, a humanidade provavelmente nunca consiga entender com clareza o amor que une dois seres para o resto de suas vidas, mesmo que esse comportamento não seja evolutivamente vantajoso e que não atenda às exigências primitivas básicas dos nossos instintos. Mas, como diria Oswaldo Montenegro: "Quando a gente ama, simplesmente ama. É impossível explicar".
Tenham um excelente dia repleto de serotonina!
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